A desigualdade da renda dos trabalhadores parou de piorar no terceiro trimestre deste ano, após um ciclo de cerca de quatro anos de elevação da disparidade salarial entre ricos e pobres, mostra levantamento da Escola Brasileira de Economia e Finanças (EPGE) da Fundação Getulio Vargas (FGV), obtido pelo Valor.
O índice de Gini do rendimento domiciliar per capita do trabalho foi de 0,628 no terceiro trimestre deste ano, resultado igual ao registrado no terceiro trimestre do ano passado (0,628) – o índice varia dentro de uma escala de zero a um. Quanto mais próximo de um, maior o nível de disparidade de renda.
De acordo com o pesquisador Daniel Duque, autor dos cálculos, o indicador exibia tendência de piora em relação ao mesmo período do ano anterior desde o quarto trimestre de 2015, quando ficou em 0,609. Naquele ano, os salários pioraram para ricos e pobres, mas a base da pirâmide sofreu mais intensamente os efeitos da recessão.
O pico da desigualdade nesse período mais recente foi atingido no primeiro trimestre deste ano, quando o índice de Gini foi de 0,631. Os três primeiros meses do ano são, marcadamente, os piores para o mercado de trabalho. Assim, o índice até recua para 0,629 na passagem para o segundo trimestre, mas seguia em alta em relação a igual intervalo do do ano anterior, comparação que não sofre a influência de fatores sazonais.
Duque diz que a interrupção da sequência de piora da desigualdade de renda neste terceiro trimestre era aguardada, já que o índice mostrava movimentos cada vez menos desfavoráveis. Para ele, contudo, é cedo para afirmar que o ciclo de aumento da disparidade da renda chegou completamente ao fim.
“O que parece claro é que o atual ritmo de melhora do mercado de trabalho está se mostrando finalmente capaz de absorver a parcela mais pobre da população, o que tende a puxar a desigualdade para baixo. Portanto, se melhorarmos só um pouco o ritmo, vamos começar a ver redução na desigualdade”, diz ele.
Os cálculos foram realizados pelo economista da FGV a partir dos microdados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) Contínua, divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O levantamento acompanha a série histórica da pesquisa, iniciada em 2012.
O tema da desigualdade ganhou destaque nos últimos meses com protestos de norte a sul da América Latina, especialmente no Chile. A disparidade de oportunidades e a piora da qualidade de vida vêm sendo apontadas como uma das razões para o caldeirão de protestos na região, embora não exista uma explicação simples.
“Já há ampla evidência de que desigualdade elevada traz menos bem-estar para uma população. Há menos coesão social, mais ‘social unrest’ [inquietação social] e mais instabilidade política. Muito provavelmente, há uma relação causal entre os altos níveis de desigualdade da América Latina e a instabilidade estrutural do subcontinente”, diz Duque.
Conforme divulgado pelo IBGE, a taxa de desemprego do país estava em 11,8% no terceiro trimestre deste ano, abaixo do registrado no mesmo período do ano passado (11,9%). No intervalo de um ano foi absorvido 1,533 milhão de trabalhadores, principalmente informais.
Uma abertura regional mostra que a estabilização da desigualdade no terceiro trimestre foi acompanhada pela região Sudeste, que concentra 45% dos trabalhadores brasileiros. O índice de Gini da região foi de 0,603 no terceiro trimestre deste ano, o mesmo nível registrado um ano atrás.
Outras regiões mostraram piora ou melhora da desigualdade no período. Entre os números melhores, o índice do Centro-Oeste passou de 0,575 no terceiro trimestre deste ano para 0,564 no mesmo período deste ano. Já o índice da região Norte melhorou de 0,628 para 0,620 por essa mesma base de comparação. “Nordeste e Sul registaram piora nessa comparação, mantendo assim o Nordeste com o pior índice nacional [0,684] e o Sul com a menor desigualdade [0,559]”, acrescenta Duque.
Valor Econômico
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